Pela primeira vez na sua história de 119 anos, o Timbu jogou com um padrão preto

Um fato histórico, num confronto inédito no futebol brasileiro. Um ato de coragem e dignidade de quem quer resgatar a sua imagem diante de um grave erro cometido no passado. Assim pode ser definida a inusitada noite desta sexta-feira, 18 de setembro, nos Aflitos.
Em jogo válido pela 10ª rodada da Série B 2020, o Náutico empatou com a Chapecoense por 1 a 1. Mas as atenções se voltaram especialmente ao uniforme do Timbu. É que pela primeira vez na sua centenária história, o Náutico entrou em campo com um padrão preto.
A ação de marketing fez parte da campanha “Vidas negras importam” e trouxe à tona uma necessária reflexão e autocrítica por parte da instituição, que cometeu um erro grave no passado: a prática de racismo.
Até o início da década de 1960, o Clube não aceitava o ingresso de profissionais negros nas suas equipes. O treinador Gentil Cardoso foi o pioneiro a quebrar essa terrível escrita.
“Gostaríamos de apagar esses casos do racismo em nosso passado. Mas isso não possível. Um pedido de desculpas não é suficiente. O que a gente pode, e vai fazer, é contribuir cada vez mais no combate ao racismo estrutural e a violência contra os negros”, garante o texto na peça institucional.
Para isso, o Clube criou mecanismos internos para que casos de racismo sejam mais rapidamente denunciados e apurados.
FATÍDICO EPISÓDIO
Quando aconteceu o fatídico e deletério episódio por parte de torcedores na arquibancada dos Aflitos, no Campeonato Pernambuco de 2002, eu estava lá.
Perplexo fiquei e desaprovei de pronto aquele ato horrendo e não condizente com a dignidade humana. Como uma forma de hipnose coletiva, alguns insanos começaram a ecoar de forma intensa os urros imitando um macaco. De repente, o coro foi se tornando mais forte, a cada tiro de meta cobrado pelo então goleiro do Santa Cruz.
Com razão, Nilson se irritou e pediu providências ao árbitro. Porém, naquela época, há pouco mais de 18 anos, nada poderia ser feito contra a atitude nefasta.
Mas hoje, creio que o assunto esteja sendo definitivamente passado a limpo.
A CORAGEM DA AUTOCRÍTICA
Não é novidade para quem acompanha futebol de que a arquibancada é uma espécie de território “sem dono e sem lei”. É o divã informal da brutalidade e estupidez humana, onde se descarrega frustrações, e se agride verbalmente, e também com gestos, torcedores, jogadores, árbitros…
Além do racismo, o machismo, a homofobia e até mesmo a misoginia ainda são praticados num estádio de futebol. E aí eu me volto para os cenários nacional e até mesmo internacional.
É preciso seguir o exemplo do Náutico e se fazer uma tomada de atitude por parte de todos que fazem o futebol, até mesmo o desporto como um todo. Pois ainda há muito no que se avançar em relação ao combate ao racismo em todos os âmbitos da vida humana.
Fotos dos jogadores: Caio Falcão/CNC
Foto de Gentil Cardoso: Náutico em fotos
Artes e vídeo: CNC